11.2.06

Rótulo

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Não vim com rótulo. Modo de usar. Indicação. Não sei pra que sirvo. O que contenho. Se curo ou enveneno. Se tenho prazo de validade.
Se alguém se propõe a falar sobre mim, escuto, com o maior interesse. Quero saber alguma coisa - qualquer coisa a meu respeito! Leio atentamente o que dizem os astros, as características dos leoninos, tentando ver se me enquadro. Ou procuro me entender no horóscopo chinês onde descobri que sou Cão. Me investigo nas linhas da minha mão, proféticas e emaranhadas. Nos olhos do psiquiatra enquanto ele me fixa esperando uma palavra que não ouso articular. (Ah, meu Deus! O que ele sabe que eu não sei?!) Tento me descobrir no espelho, mas é onde mais me confundo! Já me procurei em agendas antigas, em cartomantes, ciganas, em regressões a vidas passadas.
Me busco no eco das Cordilheiras, na pracinha onde eu brincava. Na música que ouço baixinho. No cheiro bom dos meus filhos. No que escrevi nos meus diários. Nos versos que rabisco. Na dor que me dói no peito. Nos meus boletins escolares. Nas redações do colégio. Nas minhas listas de compras. Nos álbuns de fotografias. Na certidão de batismo. No olhar dos meus amigos. Nas saudades que sinto. Naquilo que me indigna. Em tantas coisas que adio. Em tudo o que acho engraçado.
Me procuro nas gavetas, nos testes de grafologia, nas roupas que sempre uso, nos programas de TV, me procuro nos romances, nos livros de auto- ajuda, nos porta retratos da sala, nos filmes com final feliz, nas ruas da minha cidade, naquilo que sonho ser.
Qualquer pessoa sabe mais de mim do que eu.

Um comentário:

Eurípedes disse...

Ana,
Só de brincadeira:
Você escreveu minuciosamente a bula
Sem destacar a indicação
Deu ênfase aos "defeitos" colaterais
Ninguém vai querer te tomar não
Abração

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