25.5.06

O tempo



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Hora de acordar. O sonho no sono. Os olhos fechados. O pesadelo. As datas, os dias sem fazer nada, a urgência de fazer tudo. O despertador. A dor. O tempo perdido. As horas em salas de espera, em filas no banco, o saldo no banco. Vermelho. As prestações. Os prazos. Os pré-datados. Os pré-natais. Nove meses de gestação. Amamentação. As noites em claro ninando filho com cólica. Os horários marcados e esquecidos. Os atrasos. Os vencimentos. A irritação. A hora da novela. Do café. A hora de ir buscar o pão. Os minutos a mais no chuveiro enquanto a água quente escorre no corpo. Os minutos a mais na cama, na preguiça de levantar de manhã. O tempo que passou. As lembranças com datas difusas. A idade dos avós. A velhice dos porta-retratos ovais pendurados na parede. A fruta comida verde, no pé, sem tempo de amadurecer. O negrinho na panela comido quente, sem calma de esfriar. O tempo certo da água no fogo pra fazer o chimarrão. A época dos dias cinzentos, das geadas, do Minuano que faz barulho na janela. Que dia é hoje? Idade pra entrar no cinema, pra votar, pra tirar carteira de motorista. Festa de 15 anos. Álbum de fotos amareladas dos 15 anos. Cabelo dos anos 70. Músicas dos anos 80. Rita Lee e mania de você de tanto a gente se beijar. O tempo que voava nas férias de verão. Folhinha na parede da casa da minha avó. A maioridade. A felicidade. Feriados. Dias santificados. Banho de rio, cesta de lanches e mutucas. Cheiro de bronzeador misturado com cheiro de mato e barulho da cachoeira. Limo verde na pedra, avenca brotando da terra, sombra e luz brincando na água. Hora do almoço. Sempre lá fora. Sempre na mesa enorme lá de fora. Corredor comprido, barulho de pisadas no chão. O armário de livros. Hora da séstea e de ler escondido. Tensão. O relógio lá de fora sempre toca um badalo para cada hora. Meia noite, hora de fantasmas, cabeça tapada. Doze vezes o relógio avisa. Fantasmas. Misturados com as leituras proibidas. Tanto mistério. Tanto medo e a imaginação não pára e o coração dispara. Pão de minuto. Revista semanal, Cólica mensal. Tempo passando. Os aniversários, com guaraná. Volta cedo, não demora! Horário de verão. O Tempo e o Vento. Clarissa. Cheiro da casa da minha avó. Coisas guardadas tempo demais. Coisas adiadas tempo demais. Relógio biológico. Tempo perdido. Temporal. Lacuna. E o tempo não pára. E agora? Pressa, urgência, aflição. Tem que ser agora. Abre os olhos. Acorda, menina! Há vida lá fora!
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7 comentários:

Luiz Felipe Botelho disse...

Ana, vim ver suas fotos e acabei descobrindo que você sabe fotografar com as palavras. Que texto imagético é este aqui! A cada frase uma cena em movimento, uma sensação familiar, um reconhecimento de experiências humanas que vivi ou testemunhei, flashes de memórias aparentemente perdidas mas, na verdade, tão presentes em você, em mim e - pelo que parece - em qualquer um que queira olhar para isso. Não é necessário pressa. Sim, há vida lá fora, assim como há vida aqui dentro. São dois tipos de tesouro, duas instâncias preciosas que não precisam andar separadas. Uma alimenta e fortalece a outra. Fica bem. Te agradeço pela experiência.

Anônimo disse...

"Há vida lá fora!" agora só falta ir lá viver! ;) Beijo,

Anônimo disse...

Gostei muito!
As vivências acumuladas em cadeia no tempo que nunca pára...
Parabéns!

Anônimo disse...

Ana, adorei o texto.
Gosto muito de "te ler".

Tania Velázquez disse...

Ana! Amei, viajei, me vi dentro do seu texto, em Lavras, no meu tempo de menina. Que saudade!
É...o tempo não pára e ao mesmo tempo, não existe tempo.
Mas não vamos falar de metafísica.
Bjus

Anônimo disse...

Oi Linda Ana!! Sempre tive vontade de comentar tuas mágicas escritas. Ontem descobri que ainda escrevia. Então, quero que saibas, que sou tua fã e gosto muito de te ler.

Anônimo disse...

Que delicia de texto!!!

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