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"Depressão, ando às voltas com o assunto. Não por mim, benzadeus, ao longo da vida desenvolvi uma artilharia completa de mecanismos contra males do espírito.
A atualidade nos colocou, a todos, num mundo de possibilidades inexistentes há 30 anos. A vida era mais arrumada e seus rumos nos eram indicados pelos pais, por hábitos culturais, por religião, moral e o escambau. Tudo isso caiu muito rápido, o leque de opções se arreganhou. No mundo de agora a gente pode desejar de tudo, e, ao tudo poder, já não sabemos mais o que desejamos. Somos autônomos demais e muitas vezes temos a sensação de estarmos aquém daquilo que podemos.
Pra complicar sentimos que a vida que levamos não é satisfatória (antes nem isso acontecia, a gente se adaptava ao que fora imposto e, bem ou mal, seguia ali). Temos a sensação de que talvez o que desejamos não nos faça bem. Como não estamos habituados a escolher, continuamos tomando rotas pautados pelo olhar do outro, escolhemos o que a sociedade diz que nos fará feliz, sem olhar pra dentro e reconhecer nossos reais pendores. Então, quando finalmente podemos escolher por nós e que temos os caminhos da vida nas mãos, desastrados, nos deparamos com a contrapartida, o preço a pagar: a angústia, a depressão, as fobias, os sintomas psíquicos.
Como se não bastasse a surpresa incômoda, existe uma lenda de que a vida plena só se dá quando se é feliz. Isso é uma balela inalcançável, estamos embicados pra a morte desde o primeiro minuto de vida e nem um louco poderia ser feliz tendo consciência, inelutável, desta natureza comum a todos. A nossa essência é trágica e ponto. A vida melhora muito quando se convive com ela da forma que ela é, ao invés da mentirinha que a atualidade criou, cheia de promessas e truques para abolir males 'inabolíveis'.
Eliminar a depressão pode ser muito perigoso porque ela é um indicador de que a rotina que se está vivendo não é benéfica. Sofrer faz parte desse troço que fazemos aqui, ora, é necessário compreender o que provoca o sofrimento e tratar - não eliminá-lo! - porque ele é o alerta que pisca e ajuda a prevenir o mal. Ele não é o mal em si! Não queremos um cenário em que todos seremos normalizados por regras incutidas, ou pior, por uma farmacopeia que nos uniformiza, retirando afetos bons junto com os maus!
A cantora Joni Mitchel que sofreu anos de depressão, diz num vídeo a que assisti outro dia:
"A depressão pode ser a areia de onde sai a pérola (o melhor trabalho pode sair daí quando se é artista). Se você se livra dos demônios e das turbulências os anjos saem voando também. Eles fogem." "
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